Queridos,
todos!
Faz
precisamente hoje um mês que deixei o meu “centro do mundo”! Um mês passou
rápido... Houve quem me dissesse que o processo de adaptação teria lugar nas
primeiras 3 semanas... se assim for, prova superada! Mas a “coisa” não é tão
linear assim, antes fosse!
Há
dias de maior ansiedade, em que a saudade bate mais forte, em que a
“largatinha” rabeia mais, cutuca mais e
se faz sentir!
Esta
semana foi pautada por esse sentimento mas muito provavelmente pelo conjunto de
acontecimentos a ela associados: o Domingo era de Páscoa e o meu aniversário, o
trigésimo!
Começo
então por falar-vos do Domingo, em que a tradicional festa da “aleluia” e o
almoço de família habitual, fui substituído por um almoço não menos familiar mas
bem diferente no que à companhia, envolvência, gastronomia e ritual, diz
respeito.
Fomos
convidados (eu, Luis Pedro, Clara e Helder – profs. de cardiopneumologia de
coimbra) a almoçar em casa de uma família angolana. Pude finalmente satisfazer
a vontade, que havia anteriormente demonstrado, de conviver com os “locals”,
sentir a cultura, a genuinidade e a tradição destas gentes...pude “beber” um
bocadinho dessa verdadeira essência! E sim... amenizou um bocadinho esse
sentimento de um domingo de páscoa longe da família mas isso, será sempre,
insubstituível!
Confesso
que estava expectante. Fazia-se sentir alguma azáfama em volta dos preparativos
por parte da família que nos recebia, não só pelos telefonemas vários que nos
iam fazendo, mas também pela insistência e pela manifesta questão que nos
demonstravam em contar com a nossa presença para o momento.
Cacuaco
era o ponto de referencia para a localização do “evento” no entanto implicou um
percurso por terra batida com desvio para o interior...demos rápido com o sitio
afinal, as coordenadas foram precisas e facilmente percepcionadas!
Na
rua esperava-nos a mãe do Artur (um menino doce e terno que temos tratado ao
longo da semana por bronquiolite), recebeu-nos com um sorriso e um forte
abraço.
Cá
fora já se fazia sentir a música e o cheiro a carne grelhada. Lá dentro, casa
cheia. Família, amigos, vizinhos, conhecidos...toda a gente entra e é chamada à
festa! E pelos vistos, cá em Angola é
assim! Todos são “primos”... e mais um é sempre bem vindo! ;) Fomos
apresentados e recebidos por todos como se fossemos parte integrante da
família... e foi assim que nos fizeram sentir ao longo de toda uma tarde! Muita
conversa, muitos sorrisos, muitos abraços e muita coisa boa... a juntar-se ao
calor de uma tarde tórrida em Luanda, muito calor humano também!;)
E
para dominar tanto calor só mesmo uma arca bem gelada (por pedras de gelo, nada
de electricidade!) cheia de refrescos, águas, cucas e vinho. Para acompanhar,
uma mesa cheia de tudo e mais alguma coisa!. Tudo caseirinho e confeccionado
pelas mulheres da casa!
Foi assim que tive a oportunidade de
experimentar a tipicidade da gastronomia angolana. E sim, experimentei tudo com
a boca pois só dessa forma posso ser crítica face àquilo que os meus outros
órgãos dos sentidos podem absorver e deturpar! J
E confesso que no que concerne ao aspecto visual, houve um prato que me meteu
“respeito”: Catatus!
Basicamente,
catatus são lagartas, a fazer lembrar bichos da seda ou mesmo as lagartas da
cove! Os catatus vinham refogados com legumes e cogumelos (pareciam pleurotus).
Tomei folgo, alimentei-me de coragem e levei um à boca! Que sensação estranha,
que me deve ter levado a contorcer todos os músculos da face! Os catatus são
crocantes, meio ocos no interior e com um sabor esquisito... a terra! Só
consegui que descessem o esófago porque iam bem regados com um belo néctar dos
deuses: EA – cartuxa!:)
Tudo
o resto que “compunha” a mesa fez com que a lembrança desse sabor
desaparecesse! Assim estrei-me no calulu (tipo caldeirada de peixe, neste caso
corvina, com rama de batata, courgete, beringela e oléo de palma), na Kisaka
(refugado de folhas de mandioca, moídas a fazer lembrar esparregado), Rama
(rama de batata doce refugada). Reforcei, na prova que já havia anteriormente
iniciado, ao feijão em óleo de palma, mandioca, batata doce, banana pão, funge
de madioca e funge de milho, moamba de galinha entre outras coisas mais
vulgares que habitualmente estão presentes também nas nossas mesas como sendo
peixes grelhados, carnes e estufados. (pois é amigos, não consigo parar de
alimentar o meu colesterol!! L
)
Doces,
também havia, mas nada de muito diferente daquilo que temos por ai. Mousses,
brigadeiros, pão de ló, serradura... O doce mais doce dos doces?! O sorriso das
crianças, muitas... que rodopiavam, que saltavam, brincavam, nos abraçavam e
fizeram companhia ao longo de toda uma tarde!
A
música, nos quentes ritmos africanos do
kuduro, semba e Kizomba fizeram a combinação perfeita para um Domingo de Páscoa
único, diferente, especial...
Abril
acordou com uma segunda feira serena... bem preenchida por 5 horinhas de aulas.
Ao Luis, deixei-lhe a mentirinha do dia: “ Marquem-me bilhete de ida! Estou
farta e não consigo estar mais aqui! Não aguento mais...quero ir!!”. Foi o
suficiente para que mudasse de cor e instantaneamente me dissesse: “Não estás
bem! Anda aqui mais eu, vamos apanhar ar, vamos conversar, que tu não estás
bem!!”. Desatei a rir-me! Definitivamente, mentir não é o meu forte! ;)
E
foi depois de terça-feira que o “meu dia chegou”! Foi sem duvida um dia, uma
data, um aniversário diferente e único que recordarei e levarei para sempre
naquele lugar especial! As mensagens, emails, telefonemas e vídeo-conferências
que todos carinhosamente me foram fazendo e deixando encurtou a distância que
nos separa e amenizou um bocadinho a saudade de estar longe de quem tanto gosto
e queria ter perto neste momento tão especial! Afinal, trinta anos, são trinta
anos! J
Os
colegas por cá, que já considero amigos, também foram uns queridos e
contribuíram para que esta ocasião fosse memorável. Organizaram-me uma festa,
um jantar e saída por Luanda! Foi num restaurante português com nome italiano: “Veneza”!
A comida óptima (bacalhau de pedir por mais – é assim mesmo o nome, bacalhau no
forno e lombo de vitela grelhado) e no final apaguei as velas num bolo
igualmente delicioso, os desejos...os de sempre! J
O
rumo a seguir previa-se “chique”! segundo eles, “a combinar com a ocasião”!:)
Fomos ao Doo-Bahr. Um bar-discoteca, pelo que consta, pertence à Isabel dos
Santos (aquela que joga ao monopólio sozinha)!;) Um espaço que prima pela boa
escolha na decoração e design arrojado! Repleto de gente, e boa música. É ali
que se encontra a “nata da nata”! Mulheres e homens angolanos super bem
“montados”, “kitados” e “artilhados”. Sobretudo as mulheres, lindíssimas! As formas curvilíneas, super-bem
delineadas e na dança, nossa senhora, ninguém as bate! Tenho amigos que iam
gostar de ver! J
Enfim...à
saída do espaço damos de caras com o “universo paralelo” de que vos tenho
falado. 3 meninos de rua brigam por uma nota de 500kuanzas... quase despidos...
e magros de fome...e é assim esta Angola assimétrica, com duas realidades a
conviver porta a porta e sobre o mesmo tecto... num dia 4 de Abril, feriado em
Angola: Dia da Paz!
Que
a paz chegue realmente...que toque o mundo... e os nossos corações!
Com
carinho e amizade vos abraço....
Rita
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