Meus queridos todos!
E eis que chega ao final mais uma semana... menos uma para o
meu regresso...e está tão próximo! :)
Cá
estou de novo sentada na cadeira de sempre, que já me conhece e já me trata por
tu e que sabe muitos dos meus momentos (sim, esta cadeira e estas paredes, estas
4 paredes, já me guardam muitas histórias, já sabem muito a meu respeito! :) ). Cá estou na cadeira
em que me sento e que me deixa sempre uma vontade imensa de sentir perto... quem
está longe!
Então
é aqui, nesta cadeira, em que pego na caneta e me apercebo e surpreendo com a
capacidade que uma simples caneta tem de encurtar as distâncias... da
facilidade com que, quase como que por osmose, os meus sentimentos, as minhas
emoções e a minha vida por aqui, me vão escorrendo pelos dedos e se transformam
em tinta no papel ... da facilidade com que o meu coração vem parar ás mãos...
e dessa forma me aproximo de ti que me lês neste momento e me faço sentir eu, contigo!
Hoje,
neste quarto de onde vos escrevo o tempo sente-se diferente, tem uma conotação
diferente, vive-se diferente... Talvez o sinta hoje assim porque muitas vezes
“neste quarto o tempo é medo e o medo faz-nos sós” e hoje consigo
perspectiva-lo de uma outra forma... Talvez porque sinta já o “cheiro” da
proximidade do “meu” centro do mundo, talvez... mas a verdade é que gostava de senti-lo
e sentir-me sempre, ou mais vezes com esta serenidade, com esta leveza e
tranquilidade que hoje me acompanham... Talvez isso faça parte do processo e da
aprendizagem... talvez... e eu acredito
que sim porque já está a fazer! J
Estão
a bater à porta os 3 meses... e se passaram rápido! Uns dias a saborea-los da
melhor forma outros, menos bem. De qualquer forma, o meu balanço não pode ser
se não positivo! Muito...
Conheci
um novo continente, um novo pais, uma nova cultura! Conheci novos povos, novas
caras, novas gentes e fiz novos amigos! Distribuí e recebi sorrisos. Partilhei
e recebi conhecimento. Senti novos sabores, novos cheiros, novas músicas...
Dancei outras danças, vivi outros ritmos, andei por outras andanças, corri
outros caminhos, caminhei por outras estradas... E já fiz tanto aqui mesmo
quando tantas vezes me senti só, neste mesmo sitio, nesta minha cadeira...
talvez tivesse eu fugido no tempo... sem me ter apercebido que é tudo tão maior
aqui!
Saí
da minha “zona de conforto” e este olhar de fora para dentro também me permitiu
encaixar tanta coisa que andava meio que “perdida” em mim...! Fez-me bem...
está a fazer-me bem... Permitiu-me escutar-me melhor, perceber-me melhor,
sentir-me melhor...acredito com muita força que nada acontece por acaso e que
tudo tem uma razão muito forte para o ser...e isso é mais forte que tudo o
resto! J
Aqui
está a entardecer... sentem-se os dias a ficar menos quentes. O dia acorda e
adormece mais fresco. Está para chegar o cacimbo, já devia ter chegado...
talvez só chegue quando eu partir, para não me enlouquecer entretanto!:) Abril
foi o mês de chuvas. E a dificuldade que as chuvas trazem a estas gentes?! Minha nossa... há
alunos que têm que deixar as aulas para conseguirem chegar às suas casas pois
se não o fizerem correm o risco de ficarem sem acessos devido à lama e à
entrada de água dentro das habitações. E deixem-me que vos fale um pouco dessas
condições habitacionais: a maior parte das casas, não são propriamente casas,
são cubos de chapas de zinco. Quatro placas e está feita uma “casa” e elas
crescem como cogumelos mesmo aqui ao lado da universidade. Não têm água, nem
luz e muitas das vezes, são as velas que iluminam nas noites quentes os livros
por onde os nossos alunos estudam... é difícil de imaginar, mais difícil sentir e conviver de perto com uma realidade
tão diferente e tão díspar da nossa....
A
época das chuvas levou-me a ver algo que nunca sequer tinha imaginado que
pudesse virar negocio! Mas bem, como eu costumo dizer, aqui em Angola eu já
acredito em tudo! J
Há zonas que ficam completamente alagadas, enlameadas e de difícil acesso. E
então, em boa verdade vos digo que existem pessoas que se servem dessas
situações para ganhar a vida: cobram para revestirem com sacos de plástico e
fita cola os pés e as pernas de quem não tem possibilidade de adquirir umas
galochas, cobram para colocarem pedras em zonas de charcos e lama por permitir
que as pessoas se consigam deslocar de
um local para outro e cobram ainda para transportar ás “cavalitas” quem não
esteja disposto a molhar-se e ficar atolado!
É a luta pela sobrevivência num pais em que vale tudo e que tem tudo
para ter tudo... enfim....
Aqui
já anoiteceu... O dia virou noite com o pôr-do-sol mágico a que Luanda me tem
habituado... e vou confessar-vos uma coisa, Angola tem o pôr-do-sol mais lindo
a que assisti em toda a minha vida!
Agora
na noite escura, são as estrelas quem mais brilham! Pedi a uma delas um favor!
Agora peço-te a ti: Abre a tua mão, isso! Agora fecha! Junta-a agora à tua
metade esquerda e superior do tronco, bem próximo ao coração, isso! Agora abre!
Sentiste?! Pedi à estrela mais brilhante
que deixasse um beijo na tua mão! ;)
Abraço-te
forte com saudade...
Rita
Sousa